Título: O Rouxinol
Autor:Kristin Hannah
Editora: Arqueiro
Classificação indicativa: Adulto
Gênero: Romance Histórico
"Os homens contam histórias. As mulheres seguem em frente com essas histórias. Para nós foi uma guerra nas sombras. Ninguém organizou desfiles para nós quando a guerra acabou, não nos deram medalhas nem nos mencionaram nos livros de História.Fizemos o que precisávamos fazer durante a guerra, e quando tudo acabou, nós recolhemos os cacos para começar a vida de novo."
Antes que essa história vire um filme (como descobrimos que foi anunciado) e o coração do leitor fique ansioso e preocupado por uma adaptação ruim, garantimos apenas que não conseguirá chegar aos pés dessa narrativa, que desvenda a França sitiada pelos nazistas, e defende a força de suportar sua terra, sua casa invadida e rendida para o inimigo, e continuar lutando.
A França não estendeu a bandeira branca na 2ª Guerra Mundial por fraqueza. Foram as feridas antigas da 1ª Guerra Mundial (A Grande Guerra, como até hoje é conhecida), por estar cercada de todos os lados pelo Reich (Alemanha, Itália, Espanha), que não houveram opções para salvar o país senão entregar-se. Porém, se o governo se rendeu, o povo francês não. E é sobre isso a história deste livro, que conta a passagem deste povo por mais uma guerra através da vida de duas irmãs: Vianne e Isabelle.
Vianne, a irmã mais velha, vive em Carriveau, uma cidade pacata da França, que vê sua vida mudar do dia para a noite, quando seu marido é convocado para servir no exército. Só em casa apenas com sua filha, a personalidade de Vianne lhe diz que tudo ficará bem, e que deve aceitar as mudanças sem questioná-las: a rendição da França, a zona ocupada, e oficiais alemães aquartelados em residências familiares de sua cidade.
Isabelle é uma jovem obstinada a viver em Paris, junto de seu pai, que se tornara frívolo após retornar a 1ª Guerra Mundial e perder a esposa em seguida. Sendo trocada de colégios internos por sua falta de compostura, resolve, na última tentativa de abandono de seu pai, se reunir às frentes de batalha e lutar pela França, como enfermeira ou motorista de ambulância. Mas seu destino muda quando encontra um jovem preso político, Gaëton, e se inflama não só por ele, mas pela vontade de ajudar libertar o país.
Por perfis tão diferentes, o caminhos que ambas trilham em determinado momento do livro é totalmente oposto. Vianne tenta ajudar amigos e cidadãos perseguidos da cidade pelos nazistas (judeus, comunistas, homossexuais), sem ser descoberta, e ainda se preocupando com a segurança de sua filha, e vendo a normalidade desmoronar totalmente. Isabelle destribui panfletos contra os alemães, e depois emerge em uma carreira na resistência como "Rouxinol", uma espiã que criou uma rota de fuga para aviadores dos Aliados que caiam na França e precisavam ser resgatados.
Dentro da vida de ambas, enxergamos as dores da França: Judeus perseguidos como em todos os países invadidos pelos alemães na época, assassinatos a sangue frio e expostos em público da forma mais dolorosa possível (desde fuzilamento e enforcamento), o inimigo dormindo no mesmo teto que você, pânico, torturas, estupros... e frente a tudo isso, o povo francês ainda tentava ser resiliente. Aliás, também vemos a Resistance em suas vertentes, aquela que agia na espionagem e a que se punha na linha de fogo, sabotando os nazistas, mas ambas por baixo das cortinas, esperando o surgimento de Charles de Gaulle para finalmente salvar a França por inteiro.
Vidas foram perdidas durante a França ocupada, e outros a arriscaram para libertá-la. As que sobreviveram, tiveram que se tornar mais resilientes para recomeçar das cinzas; talvez, não aquelas causadas por bombardeios, como na Inglaterra, mas sim as cinzas de corpos desnutridos e quebrados, de perdas de amigos e familiares, de alma desacreditada que um dia a guerra acabaria. O coração pulsando era tudo o que restava para mantê-los vivos, mesmo que por alguns momentos, muitos franceses devem ter desejado mais a morte. É difícil mensurar os sacrificios que são feitos durante um período como esse.
Esse livro traz não só a História na carne do que a França ocupada passou, mas diz algo sobre o povo francês que tanto foi julgando por esse período: eles não se renderam. Lutaram mesmo quando abandonados, magros e destruídos, se opuseram ao inimigo, buscaram força para erguer a voz estrangulada. Continuar. Vivos.
O livro não é apaixonante, mas sim emocionante. Emocionante por trazer para a realidade palpável dentro da casa de uma família o que foi a guerra de perto. Emocionante por trabalhar o sentimento amor de tantas formas (paterno, fraterno, filial...). Emocionante pelas duas mulheres que trazem a resiliência de Marianne sem um nome, em cada parisiense mulher que realmente passou por isso naquele período. Emocionante por mostrar a França que é fiel à Marselhesa e resistiu.
"Tout est soldat pour vous combattre
S'ils tombent nos jeunes héros
La terre en produit de nouveaux
Contre vous, tous prêts à se battre"
Trecho da Marselhesa